10/06/2018 às 02h42min - Atualizada em 10/06/2018 às 02h42min

A mensagem

Por Gabriela Aguiar

Portal Corrente
         Dona Elza estava exausta. Cansada do trabalho. Cansada da rotina. Cansada das brigas bobas em casa. Mas estava mais cansada de si mesma, por não conseguir fazer algo realmente legal há algum tempo.

         Enquanto girava a maçaneta da porta, ao entrar em casa, perguntou-se quando foi a última vez em que se divertiu de verdade. Sem pretensões e preocupações. Seu marido andava um pouco ausente, não por querer, nem por maldade. Ele era assim, as vezes se afastava só para pensar um pouco e ter o seu tempo sozinho. Todo mundo precisa de espaço, não é mesmo?
         
         Colocou sua pasta pesada em cima da mesa e logo viu um bilhete, colocado em um envelope branco destinado a ela. Sabia de quem era. Conhecia aquela letra até de trás para frente. Pegou-o com receio do seu conteúdo e pôs-se a ler. Derramou uma lágrima no final, mas respirou aliviada.

         Seu marido, apesar de toda a distância, e de todas as discussões dos últimos dias ainda continuava lá. Ela sentia saudades do tempo em que os dois eram jovens e tinham muita energia para qualquer coisa. Às vezes se perguntava o que teria acontecido com eles, coisas normais de qualquer casamento, ela respondeu imediatamente. Mas aquele rapaz ainda morava ali dentro, mesmo que ele mesmo não acreditasse nisso.

         João sempre fora uma excelente pessoa. Tinha fascínio por literatura e arte. E tinha também um coração sereno atrelado a uma paciência enorme. Seu único ponto fraco era a insegurança. O medo sempre lhe tirara muitas coisas, por vezes, lhe tomara até seus sorrisos transformando-os em lágrimas contidas ou em pensamentos que ficavam reservados só para ele.

         Entretanto, ele estava melhorando... Dona Elza podia ver claramente o quanto ele estava diferente e cada dia parecia confiar um pouco mais em si mesmo. Deveria ser o tempo o maior responsável ou talvez fosse só a vontade de crescer. Ela sempre pensava que ele não precisava ter tanto pavor assim do futuro, nem se cobrar tanto por coisas tão pequenas. Mas não dizia nada, apenas oferecia um abraço ou melhor, o braço, para que ele tentasse sair do seu poço fundo de incertezas.

         Ela tinha se chateado com as últimas discussões e chorado durante toda a semana. No bilhete, ele dizia que passaria uma semana longe. Ela não aguentaria tanto tempo. Mas queria que passasse devagar, para dar um tempo, para respirar. Sabia que aquele tempo era mais para ele do que para ela.

         Pegou seu celular e enviou uma curta resposta à mensagem:

         “Não demore muito. Vou sentir sua falta. Mesmo quando estou chateada com você, eu sinto sua falta. Claro que ainda temos muitos planos para o futuro, preciso que você volte em breve para podermos cumpri-los. O amor é um verme resistente, ele é capaz de sobreviver em quaisquer ambientes ou circunstâncias. Boa noite e  fique bem.”

         Respirou fundo. Na falta do seu marido, abraçou a si mesma e garantiu-se de que tudo ficaria bem.
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