04/04/2015 às 15h39min - Atualizada em 04/04/2015 às 15h39min

Deputado federal Jean Wyllys manifesta sua indignação com o uso indevido da imagem do menino Eduardo

Imagens forjadas do menino segurando armas gera indignação nas redes sociais

Ascom Jean Wyllys

Estão circulando, nas redes sociais e através do Whatsapp, fotos falsas do menino Eduardo de Jesus Ferreira, de 10 anos, assassinado pela PM em mais uma ação truculenta da "guerra às drogas" no Complexo do Alemão.

As imagens apresentam um garoto supostamente armado (não tem como saber as circunstâncias em que a fotos foram tiradas) que não é Eduardo, numa tentativa desonesta e perversa de justificar sua morte e, ao mesmo tempo, fortalecer os discursos demagógicos e irresponsáveis que defendem a redução da maioridade penal. O cinismo, a perversidade e a má fé são tão grandes que são capazes de difamar uma criança morta, de apenas 10 anos de idade.

Contudo, não é a primeira vez que um homicídio violento executado pela polícia numa favela, após causar indignação e mobilização popular, é sucedido por uma campanha caluniosa contra a vítima na imprensa e/ou nas redes sociais, para a qual se recorre a fotomontagens, boatos, acusações falsas e outras formas de difamação contra quem já não pode mais se defender. Lembre-se que o Amarildo! Ou de outro caso recente: o do assassinato de Douglas Rafael da Silva Pereira, o DG, em que também houve uma tentativa de culpabilizar a vítima, para "justificar" a ação criminosa da polícia. Na época, também circularam fotos de um rapaz com um fuzil na mão, sem camisa, de bermuda preta e com boné para trás, afirmando que se tratava do Douglas — mas logo soubemos que não era ele.

O que aconteceu nos casos de Amarildo e DG — e agora no caso do Eduardo — não é diferente do que acontece com milhares de outras vítimas da guerra às drogas, assassinados por uma polícia militar treinada para enxergar favelados, pobres e pretos como inimigos a serem abatidos. É tristemente comum que vítimas sejam rotuladas como bandidos para justificar suas mortes, como se isso as pudesse justificar, como é comum que execuções sejam apresentadas como mortes em enfrentamento ou em outras circunstâncias que mascaram o acontecido — existe, inclusive, uma figura legal para essa perversidade: o "auto de resistência".

A "justificação" das mortes produzidas pela repressão policial nas favelas, através da estigmatização das vítimas como "bandidos", implica também numa mensagem mais profunda: que "bandido bom é bandido morto". Além de difamar o Amarildo, o DG e o Eduardo para exculpar a polícia — e, mais importante do que isso, exculpar o Estado por sua política irresponsável de criminalização da pobreza, militarização da vida das comunidades, guerra às drogas e manutenção de uma política de segurança que enxerga o favelado como inimigo, desprovido de direitos —, o que as campanhas sujas contra eles, que os acusam falsamente de "traficantes", estão dizendo, é: traficante pode ser morto. E deve. Estaria errado apenas se não fosse, mas, olha: era.

Precisam desumanizar o "inimigo" para que aceitemos que sua vida não vale nada. E isso, claro, também se relaciona, nesses dias, com a tentativa de despojar as crianças pobres e pretas de sua condição de crianças, para justificar que elas possam ser presas como adultos, da mesma forma que são mortas como "soldados", tanto quando eram "soldados" do tráfico (soldados que são assim produzidos pela política de criminalização e repressão do comércio de drogas ilícitas, que justifica a gestão militarizada da pobreza) como quando não eram, porque tanto faz.

Para os pobres, a maioridade penal começa ao nascer, a pena de morte é sumária e o crime é existir. Policiais e cidadãos comuns (quase todos pobres e pretos, ou brancos quase pretos de tão pobres) morrem diariamente em nome de uma estúpida guerra onde a vitória é sempre da barbárie. Tempos sombrios, nos quais precisamos muito, todos nós, fazer um grande esforço para enfrentar, com muita vocação pedagógica, esses discursos que se espalham e contaminam o senso comum, empurrando-nos para um precipício que pode nos levar a cair de novo em algumas das piores tragédias da nossa história.


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