18/01/2014 às 13h26min - Atualizada em 18/01/2014 às 13h26min

CONGRESSO DEVE RETOMAR PROTAGONISMO NO DEBATE POLÍTICO

Por Ibaneis Rocha

Diário do Poder

Em duas semanas, com o fim do recesso, Legislativo e Judiciário retomam seus trabalhos depois de um ano marcado por uma quase palpável tensão entre os dois poderes por conta do que se convencionou chamar de ativismo judicial. A discussão é um tanto complexa e merece estudos profundos, mas ao menos uma de suas causas é visível a olhos nus: a crise de funcionalidade e representatividade pela qual passa o Congresso Nacional.

Existe, hoje, um hiato entre eleitores e eleitos, representados e representantes, que foi escancarado com os protestos de junho do ano passado. A oportunidade era perfeita para que o Congresso respondesse às manifestações com algumas das reformas necessárias, e há muito reivindicadas, como a reforma tributária ou a mudança do modelo político vigente. Foram aprovadas alterações tímidas na área eleitoral, que muito pouco influem no aperfeiçoamento do sistema político nacional.

Em contrapartida, o Supremo Tribunal Federal, no final do ano, colocou em julgamento a ação proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil que contesta a permissão de financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas. A mesma OAB lançou a campanha Reforma Política Democrática e está colhendo assinaturas para levar ao Poder Legislativo uma proposta que corrija distorções do processo eleitoral e do modelo de representação brasileiros. O financiamento de campanha é um dos problemas, mas está longe de ser o único.

De qualquer forma, por enquanto, mais uma fatia da reforma política está nas mãos do Supremo, que vem modificando o sistema político brasileiro pela via judicial. Basta lembrar as decisões que fixaram que a vaga de suplente pertence à coligação e que o mandato é do partido, não do parlamentar eleito. Na prática, o Poder Judiciário instituiu a fidelidade partidária no país.

A questão é que, se as mudanças esperadas, na área política ou nas demais áreas, não chegam pelas mãos do Congresso, chegarão pelas mãos da sociedade, que por meio de instrumentos legítimos irá reivindicar seus direitos. Basta ver o volume de mandados de injunção ajuizados do STF nos últimos anos para se ter pela consciência disso. Se o Legislativo fica omisso diante de sua atribuição de regulamentar direitos constitucionais, o Judiciário será provocado pela sociedade a fazê-lo. E irá dar alguma resposta.

Em outubro de 2012, em sua sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, o ministro Teori Zavascki, pouco antes de assumir o cargo de juiz do Supremo, já alertou para esse fenômeno, de forma didática. “A função jurisdicional é uma função inafastável”, disse. Ou seja, o juiz não pode deixar de decidir um problema que lhe é colocado alegando lacuna legislativa. E deu exemplos. Um deles foi o de um processo no qual deveria se decidir sobre a guarda de uma criança nascida em ventre de aluguel: “Como deve um juiz intervir em um caso como esse? Essa é uma questão que não está legislada e o juiz precisa decidir”. Por isso, quando há lacunas, juízes usam analogia, princípios gerais do Direito, princípios constitucionais. E, na prática, editam uma norma para o caso concreto.

Diante disso, em muitos casos, para que não haja o chamado ativismo judicial, basta que o Congresso enfrente as questões polêmicas que surgem por conta das novas relações sociais. Não há um histórico de ingerência indevida do Judiciário em assuntos do Legislativo. Ao contrário, alguns casos demonstram que, quando o Congresso Nacional cumpre bem suas atribuições, o Supremo as corrobora. Foi assim, por exemplo, no julgamento em que o Supremo manteve a possibilidade de se fazer pesquisas com células-tronco embrionárias ou quando se contestou o Prouni. Nos dois casos, as leis federais foram atacadas e o Judiciário as manteve intactas, respeitando a decisão política tomada pelo Poder Legislativo.

Cabe apenas ao Congresso Nacional retomar para si o papel de protagonista do debate público e político. A ninguém interessa um Poder Legislativo enfraquecido. Não adianta reclamar do ativismo judicial e não enfrentar os problemas. O Judiciário atua, e atuará sempre, nos casos em que o legislador deixa de disciplinar.

Ibaneis Rocha é presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Distrito Federal (OAB-DF)


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