01/09/2021 às 16h10min - Atualizada em 01/09/2021 às 16h10min

Impeachment 3 - Artigo do Promotor de Justiça Rômulo Cordão sobre pedido de impedimento contra ministro do STF

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IMPEACHEMENT 3

O regimento interno do Supremo Tribunal Federal data de 1980, portanto, anterior a Carta Magna atual promulgada em 1988, contudo, já no texto antigo havia previsão expressa acerca dos crimes de desobediência e desacato praticados, respectivamente, contra a ordem e a honra de ministros, no exercício da função, no interior da corte suprema.

O art. 46 diz "Art. 46. Sempre que tiver conhecimento de desobediência a ordem emanada doTribunal ou de seus Ministros, no exercício da função, ou de desacato ao Tribunal ou a seus Ministros, o Presidente comunicará o fato ao órgão competente do Ministério Público, provendo-o dos elementos de que dispuser para a propositura da ação penal".

Observa-se que mesmo antes do Ministério Público ter conquistado a arquitetura constitucional que goza hodiernamente, já naquela época havia uma clara preocupação em não se misturar as funções de acusar e julgar.

Neste diapasão, o dispositivo do art. 43 do RISTF previa também: "Ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o Presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro Ministro. § 1º Nos demais casos, o Presidente poderá proceder na forma deste artigo ou requisitar a instauração de inquérito à autoridade competente".

Feita essa preleção, inevitavelmente vem a indagação, deve-se interpretar as leis e demais diplomas normativos à luz da Constituição, ou à Constituição à luz dos diplomas legais? A resposta, levando-se em conta as lições de Kelsen em sua famosa pirâmide normativa, é que a Constituição, como maior diploma político-jurídico em um Estado Democrático de Direito deve ser tida como a luz que irradia princípios para as demais normas do sistema. Isto significa dizer, as normas infraconstitucionais, confecionadas antes ou depois de promulgada a CF/88 devem ser sabatinadas a todo o instante para verificar se respeitam ou não os princípios constitucionais, é por esta razão que existe o controle de constitucionalidade das leis.

Nesta toada, a luz dos princípios trazidos pelo constituinte de 1988, no título II, "dos direitos e garantias FUNDAMENTAIS", exsurge com clareza solar, duas garantias de todo cidadão potencialmente oponíveis ao próprio Estado, quais sejam, "LIII- ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente"e  "XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção".

Agora, impende fazer uma reflexão: "alguém que não tem prerrogativa de foro sujeito à jurisdição daquele Tribunal" - (art. 102, I, b), pode ser submetido a investigação presidida pelo STF? Do estrito texto legal a resposta só pode ser negativa. Isso porque o rol de pessoas adstritas ao julgamento por crimes comuns naquela corte é taxativo, não podendo, conforme julgados anteriores do próprio STF, ser ampliado. Daí mais uma vez se questiona: Será que tal avocação indevida, de algo que não lhe pertence, não afronta os incisos LIII e XXXVII na CF/88?

O sistema acusatório (explicado na postagem 2), por sua vez, é implacável ao definir o Ministério Público como a instituição que representa o Estado-Acusação nas infrações penais (art. 129 CF/88), com exclusividade, exercendo inclusive o controle da investigação realizadas pelos órgãos policiais ou a fazendo diretamente. O novel diploma de ícone constitucional, será que pretendeu conviver com o sistema processual inquisitório, onde se confundia as tarefas de acusar e julgar em um só órgão? Em uma interpretação sistemática e teleológica, a resposta só pode ser negativa. De tal conclusão, somente pode restar estabelecido que diplomas anteriores que desrespeitam o sistema acusatório, simplesmente, não foram recepcionados pela constituição Federal de 1988, portanto, não detém nenhuma validade hodiernamente. Ademais, frise-se que o RISTF sequer é uma lei em sentido estrito, posto que não foi produzida pelo parlamento, mas tão somente um regimento interno, como o próprio nome diz, que tem o escopo de definir regras internas de procedimento no próprio STF, sem a força normativa, de jamais, está acima da CF/88.

O lei 13.964/19, popularmente denominada Pacote Anticrime, demonstrou recentemente, mais uma vez, a opção do legislador em prezar e zelar pelo sistema acusatório, ao ponto de dizer: "Art. 3º-A. O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação".

A indagação final é: ESSE PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL E LEGAL NÃO SE APLICA AOS JUÍZES DO STF?

 

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